terça-feira, 14 de agosto de 2018

O Clube Aberto de Woody Allen

É mais que certo que Woody Allen ama a morte num sentido especial: se desde pequeno que a realidade dela é dolorosa de enfrentar, o caminho mais correto será percorrer o provérbio “se não podes vencê-los, junta-te a eles” e utilizá-la como um mecanismo artístico e cinematográfico.

Aposto que, tal como eu, Woody Allen se lembra do dia em que se tornou consciente da sua mortalidade. Para nós, sensíveis neste tema em particular, a vida nunca mais foi a mesma. Os dias que se seguiram têm sempre um resquício de luta contra a ideia de que “todos, tudo, nada permanece”.

Havendo ou não um clube para gente assim, “não gostaria de pertencer a algum que me aceite como membro” e nunca me senti compreendida nesta questão, até ver “Annie Hall” e dizer para o meu cérebro “és a criança no psicólogo que está deprimida porque o universo se está a expandir”. E tal como o universo em expansão que é pobremente ignorado, a minha cabeça também se expandia em questões sem resposta, questões relativas à ideia estranhamente libertadora de que num futuro (“daqui a biliões de anos”) não haverá ninguém – nenhuma fonte de ser vivo – que possa citar de cor um soneto de Shakespeare.

Annie Hall (1977)

A ideia horripilante da morte ganhou várias perspectivas ao longo dos anos, como em todos nós, e quão gratos estamos que a de Woody Allen se tenha transformado numa espécie muito específica de arte cómica. Como no filme “Shadows and Fog”, a morte pode ganhar a forma de um assassino em série (que é, seguindo as leis ideais humanas, a sua forma natural), apenas para “ensinar” à personagem principal (uma ramificação de Woody) que, tal como um truque de magia, a nossa vida consiste na maneira como a decidimos distorcer. “Toda a gente adora ilusões. Precisa delas, como precisamos de ar” diz o mágico Armstead a Kleinman, da mesma maneira que nós dizemos a nós próprios, geralmente inconscientemente, sempre que a imagem pessoal da morte nos vem à cabeça.

No que toca à imagem que criamos desta morte, ela poderá ter dimensões mais divertidas do que outras: desde a morte jogadora de xadrez, a morte bailarina (ambas da cabeça de Bergman, sendo que a última foi posteriormente adotada por Woody Allen), a velha morte com um manto preto e uma ceifa na mão, até ao maléfico chefe que, como em “Deconstructing Harry”, te vai buscar a casa, não sabendo do facto de que não eras tu que deverias estar a morrer.

Podemos concluir que a vida sim, é cheia de “solidão, miséria, sofrimento e infelicidade, e que tudo acaba demasiado cedo” – frase utilizada directamente em alguns filmes de Woody e utilizada indirectamente em todos eles. Como coexistir com isto então? O mágico Armstead dá uma possibilidade de resposta, que podemos revisitar sempre que nos esquecermos momentaneamente dela. Mas o encontrar de uma resposta não é o aparecimento mais imediato, sendo substituído por perguntas que surgem à velocidade da luz. Woody Allen cria assim o seu clube, deixando cada uma das suas perguntas em personagens dos seus filmes que, tal como a Harry em “Deconstructing Harry”, aparecem vivas para nós.

Assim, podemos todos colocar a pergunta que Mickey faz em “Hannah and Her Sisters”: “e se o pior for verdade? E se não existir Deus e vivermos só uma vez e acaba? Não queremos fazer parte da experiência?”. Nos dias bons, e fico feliz por poder admitir que estes fazem parte da generalidade dos dias, a resposta é simples: sim. Quero fazer parte da experiência. Para isso aceito distorcer alguns pensamentos, somente para o bem, e mentir um pouco a mim própria com o propósito de me “distrair”. Para quem se quiser juntar, qualquer filme do Woody Allen será óptimo para começar.
Maria Pinto

sexta-feira, 1 de junho de 2018

The Woman Who Knew Too Much - Mariana Reis

Cinema Sem Lei: Qual é o teu filme preferido?
Mariana Reis: Não consigo reduzir os filmes que adoro num só. Tenho fases que se calhar me inclino mais para um ou outro... Mas talvez o Persona ou o A Clockwork Orange.

CSL: Neste caso, o que é para ti um bom filme?
MR: Um filme que me desafie mentalmente. Que me provoque, principalmente. Acima de tudo que faça sentir estranheza, num bom sentido.

CSL: Então filmes do Lynch, Kubrick ou Nolan, normalmente, são do teu interesse? Ou tentas não seguir realizadores?
MR: Sigo bastante alguns realizadores porque acabam por ter um estilo próprio que me agrada. Lynch e Kubrick são dos meus favoritos.

Stanley Kubrick
CSL: Uma vez, no Cinema Sem Lei, escolhi seis realizadores que já morreram (entre eles o Kubrick) e perguntei quem gostariam que voltasse. Uma pessoa respondeu-me que esses génios do cinema foram génios devido ao tempo e circunstância que viveram. Concordas com isso?
MR: Discordo. Acho que os filmes do Kubrick (apesar de ainda não ter visto todos) são intemporais! O género dele continua a ser irreverente o suficiente para ter impacto nos dias de hoje.

CSL: Devido às cenas violentas, A Clockwork Orange sofreu fortes críticas quando foi lançado. O Kubrick até pediu para o tirar do cinema. Achas que existe algum limite no que pode ou não ser mostrado no cinema?
MR: Acho que o bonito do cinema é poder explorar temas e assuntos sombrios/tabu que não se expressariam de outra forma. Portanto, na minha opinião, acho que não deve haver limites. Pelo contrário. Acho até que se deveria usar mais o cinema nesse sentido.

CSL: Os filmes do Gaspar Noé vão muito nesse sentido. Mas também há quem defenda que só aborda estes assuntos e os filma desta maneira para chocar e ser famoso por isso. Já viste alguma coisa dele?
MR: Já vi o Love, o Enter the Void e Irreversível. O Irreversível é dos meus filmes favoritos também! Lá está, chocou-me o suficiente para sofrer e sentir tudo o que se estava a passar durante o filme e não achei que fosse apenas para chocar. Se teve o poder de me afectar da maneira que afectou é um bom filme. Cinema é suposto fazer sentir alguma coisa e não tem que ser sempre boa.

CSL: Já deixaste algum filme a meio por não estares a conseguir lidar com ele?
MR: Não. Das coisas que mais detesto é deixar filmes a meio. Normalmente não costumo fugir às sensações que os filmes me provocam. Pelo contrário.

CSL: Falando em sensações e puxando para a nostalgia, qual é o ou os filmes que lembram a tua infância?
MR: Pergunta complicada. Talvez o Cinema Paradiso ou Forrest Gump. Talvez por serem filmes nostálgicos em si mas não encontro nenhuma razão em concreto. E porque associo o Forrest Gump ao meu pai (que é dos filmes favoritos dele).

Forrest Gump (1994)
CSL: E eu a pensar que ias falar no Mulan ou Rei Leão.
MR: Toy Story, Monstros e Companhia, Nemo. E por aí fora.

CSL: Uma vez que falaste no teu pai, tinham por hábito ir ao cinema ou viam mais em casa?
MR: Às vezes ainda é um habito. Ele gosta bastante e tenta manter isso em altura de férias. Quando há oportunidade também vemos em casa.

CSL: Então qual foi o último filme que viste no cinema? Valeu a pena o preço do bilhete ou mais valia ver em casa?
MR: Foi o Wonder. Mas sim,. não valeu o preço do bilhete.

CSL: Qual é o teu critério quando escolhes ir ao cinema?
MR: Ou vejo os realizadores ou pela imagem , pela capa. Tento sempre saber o mínimo possível para não ganhar expectativas.

CSL: Para terminar:
- um filme que te emocionou;
- um que te fez rir;
- um que mudou a tua vida;
- um que vale a pena rever todos os anos;
MR: - Call Me by Your Name /Paris Texas/A Man Called Ove
- Trainspotting
- Mommy/Trilogia do Before
- American History X

Mariana Reis
21
Licenciatura em Engenharia Biomédica


sexta-feira, 25 de maio de 2018

The Man Who Knew Too Much - João Ricardo

Cinema Sem Lei: Quem é o teu realizador preferido?
João Ricardo: O meu realizador preferido é o Tarkovsky. Adoro a forma como transmite tanta textura e poesia com as suas imagens

CSL: Como descobriste esse realizador? 
JR: Recomendação de amigos cinéfilos.

CSL: Tarkovsky não é um realizador de fácil acesso. Que realizadores seguias antes de chegares a ele?
JR: Antes de conhecer o Tarkovsky, via filmes daqueles grandes nomes que são clássicos do cinema como o Tarantino, o Scorsese, o Spielberg, o J.J. Abrams e o Peter Jackson, entre outros.
Ao longo  do tempo, fui me interessando pelos clássicos do Orson Welles e do Hitchcock e a partir daí fui expandindo o meu conhecimento na área.

CSL: O que achas dos filmes de hoje comparando com esses clássicos?
JR: Hoje em dia há uma maior predominância dos filmes mais comerciais, contudo  existem sempre excelentes filmes que se tornaram clássicos ou filmes de culto. 
Temos o caso do Christopher Nolan, do Yorgos Lanthimos e o Wes Anderson que têm vindo a realizar bons filmes ao longo desta década. Em todos  os pomares há colheitas soberbas e frutos podres.

CSL: Vês influências de Tarkovsky em algum realizador da actualidade?
JR: É óbvia  a influência  do cinema de Tarkovsky nos filmes do Lars Von Trier. Inclusive, o Lars até dedicou o seu filme Anticristo ao realizador russo. No entanto, deve haver uma panóplia de realizadores que contam com o Tarkovsky na sua lista de influências.

Andrei Tarkovsky

CSL: Como consequência dessa influência, também gostas dos filmes do Lars ou fazes uma distinção?
JR: Claramente que existe uma distinção entre os dois. Cada um com o seu estilo peculiar  e abordagens de temáticas distintas, apesar da influência do Tarkovsky no trabalho do Von Trier
O Lars consegue ser mais cru e por vezes mais intenso e duramente trágico que o Tarkovsky, que opta por adornar as suas filmagens com uma aura mais poético. Aliás, os próprios filmes do Tarkovsky até têm poemas do pai que são extremamente adequados ao filme e incrivelmente belos.

CSL: O que achas da migração de alguns realizadores de cinema para as séries e para o Netflix ou HBO? Achas que acontece porque o cinema "clássico" está realmente a morrer ou é apenas mais uma arma que podem utilizar?
JR: Não acho que o cinema "clássico" esteja a morrer, acho que essa migração apenas é mais uma forma dos realizadores de cinema expandirem os seus conhecimentos e de experimentarem cenários  novos direccionados a públicos novos.  Acho que existe uma diferença entre as pessoas que seguem religiosamente séries e as que preferem ver filmes. Ambas as experiências têm as suas pequenas particularidades e criar uma história para uma série é diferente de inventar uma para um filme, a meu ver. Já para não falar que o conteúdo  de uma plataforma de streaming como o Netflix é de mais fácil acesso comparativamente ao cinema.

CSL: Com as referências que me dás, pareces ser dos que preferem ver filmes. No entanto, tens alguma série que recomendes? Se sim, porquê?
JR: Sim, eu tendo a preferir cinema, contudo já fui grande fã de séries. Recomendaria a toda a gente Hannibal. Penso que a série, além de estar super conseguido em termos estéticos e de filmagem, apresenta um enredo interessantíssimo e o acting do Mads Mikkelsen é algo de outro nível! O charme e a personalidade... incrível!

Hannibal (2013 - 2015)

CSL: Quais são as outras personagens de cinema que mais te marcaram?
JR: Várias personagens me foram marcantes mas há duas que se destacam: primeiramente, a personagem principal do filme Holy Motors do Leos Carax, que está constantemente a encarnar um indivíduo diferente em cada parte do filme. Acho que essa me marcou pois o ator, Denis Lavant, mostrou-se incrivelmente versátil e com uma perfeição tal que cada personagem representada nessa película foi intensa e super realista.
De seguida, o Alex DeLarge do Clockwork Orange. É simplesmente uma personagem icónica  da história do cinema pela sua performance e pela visceralidade que conseguiu apresentar no ecrã.

CSL: Há algum género que não gostes particularmente?
JR: Não sou particularmente fã de cinema de terror ou de gore. Para mim não tem grande interesse, uma vez que não estou à procura de me sentir assustado ou perturbado enquanto vejo um filme. Acho que foram muitos poucos os filmes de terror que vi. Surpreendentemente, é um dos géneros de cinema com mais adeptos pelo que vejo.

CSL: O que é mais importante para ti quando vês um filme?
JR: Acho que cada filme tem algum aspecto que se sobressai: por exemplo, o Twelve Angry Men é um exemplo de um enredo inigualável e super bem conseguido; já o Mirror do Tarkovsky tem uma das melhores realizações que eu já tive a oportunidade de ver. Acima de tudo, tento procurar filmes que consagrem um balanço entre vários aspectos, como o acting, o enredo, a direcção e realização, fotografia e banda sonora... Como fã ávido de fotografia, aprecio bastante filmes com direcções de fotografia exímios e criativos.

CSL: Consegues dar dois ou três exemplos de filmes que sejam conhecidos pela fotografia?
O Sétimo Selo e o Persona do Ingmar Bergman. Para além dos enredos fantásticos, acho que têm excelente fotografia e também são apreciados por isso.

CSL: Para terminar:
- um filme que te emocionou;
- um que te fez rir;
- um que mudou a tua vida;
- um que vale a pena rever todos os anos;
JR: - Cinema Paradiso
- Monty Python and the Holy Grail
- Holy Motors
- Submarine

João Ricardo
19 anos
Ciências da Computação




sexta-feira, 18 de maio de 2018

The Woman Who Knew Too Much - Ana Filipa Ventura

Cinema Sem Lei: Começando com a clássica: qual é o teu filme favorito?
Ana Filipa Ventura: O meu filme favorito é Persona, de Ingmar Bergman. Sempre que penso nisso vêm-me à cabeça muitos outros, mas acabo sempre por dar destaque a este. É inevitável, teve muita importância para mim.

CSL: Como descobriste esse filme?
AFV: Foi quase uma coincidência. Nunca tinha ouvido falar de Bergman até que vi por acaso Sonata de Outono na RTP2 e adorei. Persona conheci uns meses depois, quando liguei a televisão e esse filme ia começar, também na RTP2. Reparei que o realizador era o mesmo e comecei a ver. Esse filme era diferente de tudo a que eu já tinha assistido e abriu-me muitas portas, acho que foi aí que a minha viagem pelo cinema começou.

Persona (1966)

CSL: Foste à procura de mais filmes do Bergman depois isto Ou vais vendo conforme te aparece?
AFV: Sim, sem dúvida que fui! Já vi cerca de 20 filmes dele e é o realizador que mais admiro! Agrada-me sobretudo pela subtileza e sensibilidade. Gosto da forma como pensa cada diálogo, como capta cada gesto, como cria jogos de luz e sombra. Fez-me descobrir o lado do cinema que eu mais gosto.

CSL: Graças a ele, ficaste mais fã de cinema europeu em relação ao americano? Ou não fazes essa distinção?
AFV: Acho que é impossível negar a qualidade de algum do cinema americano. Há realizadores americanos pelos quais tenho um grande respeito, como o Scorsese ou o Aronofsky, mas sem dúvida que aprecio mais cinema europeu. Penso que tende a ser mais reflexivo, mais filosófico. Na base da minha preferência está sobretudo isso, a introspecção acompanhada com a irreverência. Acho que é a fórmula mágica.
Por outro lado, este cinema tende a explorar mais o absurdo, a captar as nossas paranóias e a decompo-las no ecrã à nossa frente.

CSL: Então, para além do Persona e do Bergman, que realizadores ou filmes europeus gostas?
AFV: Gosto bastante de nomes como Lars Von Trier, Hitchcock, João César Monteiro e Jean-Luc Godard. Depois há outros que comecei a explorar mais recentemente, como Murnau, Fritz Lang, Almodóvar e Fellini.
Isto acaba por ser uma bola de neve porque um acaba sempre por me levar ao seguinte e esse a outro. Acho que já deu para perceber que o meu critério de selecção passa muito pelo realizador e pelas influências que ele teve. É assim que descubro coisas novas 90% das vezes. Valorizo muito o papel do realizador.

CSL: Deixo-te uma sugestão: Carl Theodor Dreyer. Foi uma grande influência para o Bergman e para o Lars.
Também é curioso que alguns dos nomes que falaste são conhecidos por defenderem as personagens femininas e por não as usarem apenas como personagens secundárias (Bergman, Godard, Almodóvar, Lars...). Já te tinhas apercebido disso? Achas que isso pode ter alguma influência (mesmo que inconsciente) para gostares dos filmes deles?
AFV: Apercebi-me disso muito recentemente e sim, acho que teve influência. A maioria dos filmes a que assisti na infância tinham como personagens principais homens e por isso, de certo modo, eu estava habituada a essa ideia. Quando me deparei com a mulher forte mas atormentada de Bergman ou com a mulher delicada mas de personalidade vincada de Godard isso causou-me um certo fascínio. Por isso não sei, pode ter sido esse elemento de "novidade" ou talvez porque é mais fácil eu criar empatia com a personagem porque há maior proximidade.

Aliás, muitas das cenas mais marcantes que eu vi foram protagonizadas por mulheres. Desde a dança da Nana em Vivre Sa Vie até ao discurso da Eva em Sonata de Outono.

CSL: Recentemente o Cumberbatch disse que não voltará a participar num filme onde a actriz receba menos do que ele (se ambos tiverem papéis relevantes). Achas que estamos realmente a lutar para a igualdade ou é apenas uma fase e que tudo voltará ao que era?

AFV: Quero acreditar que não é só uma fase, apesar de muitas vezes estes movimentos começarem com grande ímpeto e terminarem tão rápido como começaram e sem trazer qualquer mudança relevante. Se há muito para fazer ainda? Há. Se já muito foi feito? Considero que foi.
Acho que é já mau o suficiente ter de haver esta discussão, devia ser algo de intuitivo. É uma questão de bom senso. Duas pessoas que desempenham um trabalho semelhante devem ter uma remuneração semelhante. Dá-me alguma esperança ver atitudes como a do Cumberbatch mas é um sentimento agridoce na medida em que nada disto devia ser necessário mas já que o é, é reconfortante ouvir estas vozes masculinas. Fazem desta luta uma luta unicamente de mulheres mas uma luta mas geral, pela dignidade humana e valorização da arte, que se devia afastar de qualquer tipo de preconceito.

CSL: Nesta última edição dos Oscars falou-se na possibilidade de criar um outro prémio: o de melhor realizadora. Achas que essa distinção devia existir?
AFV: Nunca pensei a sério sobre isso, mas acho que talvez fosse uma boa forma de dar a conhecer ao público algumas realizadoras que, embora tenham trabalhos magníficos, são ainda pouco conhecidas. Por outro lado, pode também ser prejudicial, já que é um factor que acentua esta diferenciação entre homens e mulheres e, infelizmente, já temos bastantes. A verdade é que apesar do prémio tal como existe tecnicamente não excluir mulheres, há muito poucas a ganha-lo porque esse ramo começou a ser explorado por mulheres muito mais recentemente. Mais uma vez, num mundo ideal a criação deste prémio não seria necessária mas já que é, nada tenho a opor.

CSL: E as personagens femininas da actualidade? Sentes-te bem representada ou notas claramente quando são escritas e/ou realizadas por homens ou mulheres?
AFV: Nunca me aconteceu notar isso de forma clara. Geralmente quando escolho um filme para ver vou muito pelo realizador. Mas acho que mesmo que não soubesse quem realiza não iria reparar. 
Quando vi Lost in Translation, não sabia que tinha sido a Sofia Coppola a realizar. Gostei do filme porque trazia uma visão diferente das relações humanas, do estar só mesmo estando acompanhado, mas não me admirava que tivesse sido um homem a realiza-lo!
Mas é um exercício interessante, nunca tinha pensado nisso.

CSL: Antes de começarmos esta conversa disseste que começaste a gostar e a explorar o cinema há relativamente pouco tempo. Qual é o próximo passo?
AFV: Gostava de ir às origens do surrealismo, explorar realizadores como Buñuel. Adoro o absurdo e para mim o mais importante num filme é a sensação de estranheza que ele cria em mim. Acordar no dia seguinte e sentir que ficou algo ali por digerir é essencial. Por outro lado também gostava de seguir mais de perto o cinema italiano.

CSL: Neo-realismo italiano? Rosselini, De Sica? Ou o que vem depois, do Fellini?
AFV: Interessa-me mais o que vem depois, Fellini, Antonioni... Mas já tenho alguns filmes do Rosselini e do Visconti guardados à espera!
De facto isto é uma bola de neve, quanto mais descubro mais nomes surgem, mais quero descobrir.

Federico Fellini

CSL: Tens quem te acompanhe nestas experiências cinematográficas ou até é algo que preferes fazer sozinha?
AFV: Não é que prefira fazer sozinha, mas não conheço muita gente que aprecie seriamente cinema e que já tenha passado por esta fase. Mesmo as pessoas que conheço e que têm bastante interesse em cinema procuram géneros e realizadores muito diferentes daqueles que eu procuro. Por isso geralmente avanço sozinha.

CSL: Então as idas ao cinema são um problema, não?
AFV: Grande parte da vezes vou sozinha. Já me aconteceu pedir insistentemente a pessoas para irem comigo e ficar revoltada com a falta de atenção (e excesso de sono) que algumas revelaram. Por isso jogo pelo seguro e vou sozinha!

CSL: Na zona onde vives, existe algum cineclube ou algo do género que te ofereça o tipo de filmes que procuras?
AFV: Eu frequento o curso de direito, na FDUP, sendo que na faculdade existe um cineclube. Aconselho vivamente! Geralmente as escolhas são boas e por isso costuma ser o sítio fora de casa onde vejo filmes mais frequentemente.

CSL: Existe algum tipo de debate depois de verem os filmes? E se não, achas que devia existir?
AFV: A ideia inicial era essa e chegou a haver alguns debates mas depois isso acabou por falta de adesão. Geralmente as pessoas viam o filme e iam embora. Acho importante essa componente do debate, não há muitas oportunidades para discutir arte num ambiente desses. As discussões em torno de obras artísticas por vezes tendem a ser desvalorizadas, talvez porque estamos no campo do subjectivo e se considere essa parte dispensável. 

CSL: Para terminar:
- um filme que te emocionou;
- um que te fez rir;
- um que mudou a tua vida;
- um que vale a pena rever todos os anos;
AFV: - Vivre sa vie
- Vedo Nudo
- Wild Strawberries
-  Melancholia

Ana Filipa Ventura
21 anos
Licenciatura em Direito



domingo, 4 de março de 2018

Júri Cinema Sem Lei - Oscars 2018


O Cinema Sem Lei reuniu com os mais caros e prestigiados críticos de cinema desta página e fez uma votação para determinar qual o filme favorito desta edição dos Oscars.

As regras foram muito simples: Foi atribuída uma pontuação de 9 a 1. Sendo que o filme preferido de cada pessoa recebeu 9 pontos, 8 para o segundo e, pronto, é fácil perceber o resto. Somados todos os pontos de cada filme (p.e.: Call Me by Your Name - 68), o valor foi dividido pelo número de votos (68/11= 6.18). É a maneira mais científica de atribuir pontos? Provavelmente não, mas isto é uma página de cinema e não o Instituto Nacional de Estatística.

Posto isto, cá estão os resultados. (Carreguem na imagem se aparecer cortada)


Para grande tristeza do Pedro Afonso, "Three Billboards Outside Ebbing, Missouri", é oficialmente o filme favorito do júri do Cinema Sem Lei. A Sara Resende e a Raquel Borges não gostaram muito do segundo classificado, "Phantom Thread". Já "Call Me by Your Name" oscilou entre o 9 da Catarina Reis e o 2 da Sara. A Rita Limede, o Duarte Santos e a Catarina deram 1 a "Dunkirk" que tantos elogios recebeu no verão. Letícia Vitorino e o Vítor Dutta Gomes foram os mais generosos com o desenxabido "The Post". Luís Neiva e, o sempre correcto, Cinema Sem Lei, levam para casa a taça por votarem no filme que recebeu mais pontos. 

A ordem de preferências é a seguinte:

1º Three Billboards Outside Ebbing, Missouri

2º Phantom Thread
3º Call Me by Your Name
4º Lady Bird
5º The Shape of Water
6º Dunkirk
7º Darkest Hour
8º Get Out
9º The Post


Obrigado a todos os que contribuíram para esta pequena sondagem. Para o ano há mais.

quarta-feira, 14 de fevereiro de 2018

Cinema Paraíso: Sara Resende - Bandas Sonoras

Muito depois de sairmos dos cinemas, se a banda sonora for boa, vamos ficar com ela na cabeça. Quem nunca começou a cantarolar do nada a marcha imperial do Star Wars? E o tema do Indiana Jones? E do Batman? E quantos de nós não ficamos com a voz do Ryan Gosling presa na cabeça “City of staaaaaaars” depois do La La Land?

O cinema não é só apenas o que se passa no ecrã, é toda uma experiência sensorial para apreciar.  A banda sonora é um elemento essencial em qualquer filme, está ali para criar o ritmo e influenciar o estado de humor da plateia. Quantos de nós não nos sentimos tristes no final de Interstellar? Ou irrequietos quando todos os edifícios começaram a cair no Inception? A banda sonora está lá para sublinhar todos os momentos importantes no filme. Se a cena mostrar algo grandioso a acontecer, os responsáveis da banda sonora vão “colar” melodias épicas e efeitos sonoros (como na batalha final do filme Thor Ragnarok).

Às vezes nem reparamos na banda sonora. Afinal, alguém se lembra daquela música que tocava no fundo quando Mia e Vicent estavam a jantar no filme Pulp Fiction? Para Tarantino a banda sonora é tão importante como as imagens que passam: “One of the things I do when I am starting a movie, when I’m writing a movie or when I have an idea for a film is, I go through my record collection and just start playing songs, trying to find the personality of the movie, find the spirit of the movie. Then, 'boom,' eventually I’ll hit one, two or three songs, or one song in particular, 'Oh, this will be a great opening credit song”. 

Em suma, uma banda sonora bem escolhida faz toda a diferença num filme e por isso, aqui estão algumas das minhas bandas sonoras/músicas de filmes favoritas que podem juntar às vossas playlists! PS: A ordem é completamente aleatória.

Baby Driver (2017)
Este filme com o promissor Ansel Elgort foi para mim um dos melhores filmes de 2017! E por isso, não deve ganhar nada nos Oscars… Mas podem sempre ouvir as músicas do Baby no carro e fingir que são motoristas de fuga.

Interstellar (2014)
A banda sonora de Hans Zimmer fica sempre no ouvido. Nem que seja por algumas melodias deste filme parecerem que ele adormeceu no órgão e depois acordou “olha pronto, agora fica assim”. 

Inception (2010)
Mais uma boa criação de Hans Zimmer. Gosto muito de ouvir a faixa Dream is Collapsing.

La La Land (2016)
Calma haters… Podem dizer o que quiserem do filme, que é overrated, que não merecia tantos Oscars, que o Gosling canta mal… Sou obrigada a concordar com esta última pelo menos, mas a banda sonora é incrível na mesma. Para ouvir quando precisam de ficar mais bem-dispostos.

Requiem for a Dream (2000)
Vamos todos apreciar o quão mágico é Winter: Lux Aeterna. 

Wonder Woman (2016)
Esta banda sonora ficou-me dias na cabeça. Destaque aqui para a faixa épica Wonder Woman’s Wrath.

Harry Potter and the Sorcerer’s Stone (2001)
Tinha que incluir este filme aqui, não só pela fantástica banda sonora, como pelas boas recordações de infância que toda a saga me traz. Este filme foi o primeiro filme que me lembro de ver no cinema e foi a partir daí que passei a interessar-me pela 7ª arte. Obrigada JK Rowling!

The Darjeeling Limited (2012)
Não fosse Wes Anderson o Rei do cinema para mim. Tanto a banda sonora como o filme são muito especiais e um “must listen/watch”. Eu sei que têm de levar com os narizes do Owen Wilson e do Adrien Brody grande parte do filme, mas há que fazer sacrificios. 

Guardians of the Galaxy Awesome Mix I and II (2014 e 2017)
Outra banda sonora para “light up the mood”.

The Pianist (2002)
A banda sonora que podem pôr a tocar quando têm mesmo de trabalhar (até rimei).  Muito light e impede outras distracções.

Le fabuleux destin d'Amélie Poulain (2001)
Aquela banda sonora que transpira a Paris. Destaque aqui para Comptine d`un autre ete - l`apres-midi de Yann Tiersen. 

Batman Trilogy 
Sponsored by Hans Zimmer and James Newton Howard.

Lord of the rings Trilogy
Uma banda sonora muito diversificada criada por Howard Shore para exibir o amplo universo de criaturas e magia que é o Senhor dos Anéis. Gosto especialmente de ouvir os coros na faixa Minas Tirith. 

Mystery of Love de Sufjan Stevens. Da banda Sonora Call me by your name (2017)
Não adorei propriamente a banda sonora, mas esta faixa é linda. Público feminino, tomem lá a música ideal para vossos dates. De nada. 

Whiplash (2014)
Definitely my tempo. 

Pulp Fiction (1994)
A música que estava a tocar quando Mia e Victor estavam a jantar era Since I first met you dos The Robins. 



Assim muito por alto, estas são as minhas escolhas principais para ouvir! No Spotify, gosto muito de ouvir a playlist OST e Best of movie Soundtracks by GuiguiF (podem encontrar os links abaixo).
E vocês? Ouvem alguma banda sonora especial? Esqueci-me de mencionar alguma muito muito importante? 

https://open.spotify.com/user/1166888068/playlist/0lPTb2BLWD8Mkfhr4V9t3o?si=MmD4gZ1uQXadkSINhU1BBA

https://open.spotify.com/user/guiguif/playlist/1LvqYvWbQLx9PKShQNYb4w?si=l2fs3wQ4TCSd4hTxHK0ghQ

terça-feira, 9 de janeiro de 2018

Plan 9 from Outer Space vs. The Room

Qual é o pior filme de sempre?

The Room está novamente em alta depois de James Franco trazer The Disaster Artist para o cinema. Pareceu-me então pertinente tentar responder à pergunta "Qual é o pior filme de sempre?". E nada melhor do que uma breve análise pegando nos dois filmes que mais vezes levaram este rótulo: Plan 9 from Outer Space (1959), de Ed Wood e The Room (2003), de Tommy Wiseau.

Argumento

Plan 9 from Outer Space

Extraterrestres atacam o planeta Terra através do "Plano 9", que consiste em ressuscitar mortos transformando-os em zombis que posteriormente atacam os humanos.

The Room

Johnny vive com a sua noiva Lisa em São Francisco. Entediada com a vida que leva e querendo mais do que a vida economicamente confortável, Lisa trai Johnny com o seu melhor amigo, Mark.

Em Plan 9 temos um argumento claramente de série B. Ficção cientifica e fantasia, cliché, mas que desperta o mínimo interesse. Já The Room é um episódio de novela. Visto e revisto. Com cenas completamente inúteis e introduzidas no filme só porque sim (quando vão jogar para a rua, p.e.). Só de lembrar que o objectivo seria fazer algo parecido a Tennessee Williams...

Produção

Plan 9 from Outer Space


Cenários pobres e imagens de arquivo são o que saltam à vista neste filme. Os efeitos especiais também são muito pouco convincentes (mas não esquecer que estavam em 1959). Destaque positivo para a roupa e maquilhagem. 

The Room



Dizem que passaram dos 6 milhões. Para Hollywood não é um valor alto, mas é inadmissível esta qualidade de imagem. Até para o The Room. Bastava que não tivessem usado estas imagens na montagem. As cenas de sexo e a nudez são claramente para vender. Guarda-roupa e maquilhagem condizentes com a época (com a excepção de Tommy).

Actores

Plan 9 from Outer Space

As figuras que deviam ser temíveis simplesmente não são. Caem até no ridículo. As personagens que claramente são secundárias (coveiros, p.e.) também são muito fraquinhos. O restante elenco, longe de serem Brandos e Streeps, conseguem ser minimamente convincentes.

The Room

Destaque quase positivo para a sogra (que me lembra a Rosa Lobato de Faria em A Minha Sogra é um Bruxa). O restante elenco, com Wiseau à cabeça é demasiado mau para ser verdade. 

Realização

Plan 9 from Outer Space


O papel do realizador, para além de escolher enquadramentos, é dirigir actores. Neste capítulo, todas as cenas de luta foram dolorosas... Para o espectador. Intensidade zero. A tentativa de camuflar a ausência de Bela Lugosi também é falhada. Em algumas cenas nem tiveram o cuidado de pintar o cabelo de branco. 

The Room



Nada de alarmante, mas básico. Aquela cena de sexo com a água é a tradução de lame no audiovisual.

Fotografia

Plan 9 from Outer Space


Apontamentos interessantes com o fumo. O facto de ser a preto e branco protege-o bastante, mas longe de um Sunset Blvd. (1950).

The Room


Que luz azul e sombras tão naturais!



Com 16 pontos em 80 possíveis (20%), The Room é, para o Cinema Sem Lei, o PIOR FILME DE SEMPRE. 

The Room é tão mau que quase faz de Plan 9 from Outer Space um filme interessante. Em contrapartida e negando completamente o que acabei de dizer, se querem umas horas bem passadas, vejam o filme de Tommy Wiseau. De tão ridículo que é, ficamos completamente agarrados.

segunda-feira, 8 de janeiro de 2018

Review: The Disaster Artist (2017)

The Disaster Artist (2017)

Confesso que quando comecei a ouvir falar deste filme pensei que seria mais uma comédia com o único objectivo de gozar novamente com The Room (2003). Não, nada disso. The Disaster Artist dá-nos outra dimensão de Tommy Wiseau, uma figura maior do que o seu filme.

Se quisermos comparar podemos dizer que é um filme próximo ao Man on the Moon (1999), que retrata a vida de Andy Kaufman, um génio incompreendido. Não diria que Wiseau seja um génio, mas é mais do que The Room nos deu a conhecer. Sim, é um mau actor. Sim, é um mau realizador e produtor. Mas é muito mais do que aquela figura alucinada. The Disaster Artist é sobre um homem solitário e misterioso que ganhou uma obsessão com a primeira pessoa que lhe deu atenção. É também sobre sonhar e não desistir. Quase chega a ser comovente. Nunca pensei dizer isto sobre um filme do James Franco. Muito menos quando este é sobre um dos piores filmes já realizados.

Tudo isto é categoricamente mostrado por James Franco. Basta ver o The Room ou entrevistas com o Wiseau para perceber que Franco conseguiu transmitir toda a energia (ou falta dela) que Tommy possui. Não deverá chegar para o Oscar, mas também não ficaria chocado se fosse entregue a este. 

7/10

P.S.: Depois dos créditos finais ainda tem uma cena.


sábado, 6 de janeiro de 2018

Review: The Florida Project (2017)

The Florida Project (2017)

The Florida Project é um retrato dos subúrbios americanos. Sean Baker, o mesmo realizador de Tangerine (2015) (o famoso filme que foi filmado com um iPhone 5) levou-nos novamente para o mundo que nos habituou. 

Moonee (Brooklynn Kimberly Prince), uma criança de seis anos, maria-rapaz e líder do seu grupo de amigos, vive com a mãe, Halley (Bria Vinaite), num motel. Não existem regras, as crianças brincam sozinhas na rua sem qualquer tipo de acompanhamento e a mãe consegue ser tão ou mais infantil do que a filha. Vivem uma semana de cada vez, sem projectos e responsabilidades. Todo o filme é tenso. As asneiras das crianças, as melhores amigas que se tornam inimigas ou a necessidade de arranjar dinheiro para não serem expulsas. Para contrastar com tudo isto, bem perto deste motel está a Disney World, o mundo da fantasia onde nada corre mal.

De salientar a excelente escolha de actores. Parabéns para Carmen Cuba, a directora de casting. É o primeiro filme de Bria que está muito convincente, mas é para Brooklynn (segundo filme) que vão todos os olhares. Este papel foi tão natural que não sei até que ponto algumas frases foram puro improviso. Escrito ou não, a pequena actriz deixou-me completamente rendido. Para combater este elenco desconhecido, Willem Dafoe surge como o gerente do motel. Percebe-se a escolha (actor famoso = mais público), mas acaba por ser um corpo estranho no meio daquele elenco. É como se eu quisesse fazer um filme com os meus amigos de infância e chamasse o Ivo Canelas para um papel secundário. Não tenho a mínima dúvida de que o Ivo desempenharia o papel muito bem, mas haveria sempre um "quê" de estranheza.

Deste vez não usaram um telemóvel para filmar, mas o estilo continua lá. Muita câmara à mão, que combina perfeitamente com o filme. No entanto há dois pontos que lamento:
- Não exploraram devidamente o contraste entre a Disney World e o motel;
- O final, que é compreensível, foge completamente ao estilo realista que o filme estava a ter até então. E não estou a falar do argumento, mas sim da maneira como foi editado.

Se são fãs de cinema independente aqui está um bom exemplo. Mas ainda não percebi se aquele final tem força para o tirar do meu top 3 de 2017.

7/10


Review: Get Out (2017)

Get Out (2017)

Get Out é o primeiro filme realizado por Jordan Peele, famoso por participar enquanto actor em comédias de qualidade duvidosa. É por isso de estranhar quando sabemos que um actor deste registo se estreia na realização com um filme de terror. Primeiro problema: o filme não é de terror. Sangue, duas ou três perseguições e jump scares não fazem de Get Out o que estavam a publicitar: "o filme de terror com melhor nota no Rotten Tomatoes" ou lá o que era.

Get Out é um thriller muito bem balanceado entre o suspense e a comédia. Não traz nada de novo a este género, mas engane-se quem pensa que digo isto como algo mau. Nota-se alguma inexperiência em certos enquadramentos e na direcção de actores. O início, com as letras azuis e imagens de florestas remetem para o The Shining (1980), mas as comparações ficam por aí. 

Apesar de previsível manteve-me interessado pelo desenrolar da acção. As actuações estão conseguidas, sem que ninguém se destaque particularmente. No fim fico com a sensação de dever cumprido e que não me importaria de o voltar a ver uns anos mais tarde.

6/10

Este 6 serve como incentivo. Quem nunca ouviu um: "dei-te um 4 para que no próximo período te esforces um bocadinho mais e consigas o 5"?


terça-feira, 2 de janeiro de 2018

Review: Mother! (2017)

Mother! (2017)

É uma homenagem ao Rosemary's Baby, com pitadas de Misery e um bocadinho da Bíblia? Qual é o objectivo deste filme?

Mother! é uma sucessão de coisas estranhas sem grande explicação. Se até meio reagimos com estranheza, com a expectativa de perceber tudo no fim, a meio percebemos que são apenas coisas a acontecer a grande velocidade, sem como nem porquê. A dada altura senti que estava a ver um filme para adolescentes, onde alguém organiza uma festa em casa dos pais e começam a partir tudo.

Ao contrário do que li na estreia do filme, não acho que as interpretações estejam tão más como descreveram. A Lawrence está um pão sem sal, mas faz parte da personagem.

Acabei o filme com uma única certeza: o jantar do Aronofsky, antes de escrever o guião, foi bifinhos com cogumelos. Tanto os cogumelos como as ervas aromáticas vinham em sacas plásticas com fecho zip.

Se este é o melhor de 2017, o que dizer de Dunkirk ou Three Billboards Outside Ebbing, Missouri.

5/10



segunda-feira, 1 de janeiro de 2018

Review: Three Billboards Outside Ebbing, Missouri (2017)


Three Billboards Outside Ebbing, Missouri (2017)

Chegou a altura do ano em que vemos tudo o que está nomeado para os Golden Globes e, mais tarde, Oscars. Se o tédio matasse, há dois anos teria morrido três vezes ao escolher Joy como o primeiro filme desta lista. Por isso este ano decidi jogar pelo seguro e atribuir esta tarefa a Three Billboards Outside Ebbing, Missouri. O nome do filme pode não ser catchy, mas foi o do realizador que me saltou à vista: Martin McDonagh, o Sting dos realizadores (vão pesquisar fotos do senhor). O mesmo autor de In Bruges (2008). Para quem viu este filme sabe o tipo de humor que está para vir.

McDonagh subiu um degrau neste filme. Conseguiu usar o mesmo humor sarcástico e muitas vezes duro, para contar um verdadeiro drama. Acompanhamos Mildred, a mãe de uma adolescente que foi morta e violada perto da sua casa. Para chamar a atenção das pessoas e autoridades que, na sua opinião, pararam de procurar o culpado, decide usar os três outdoors abandonados (onde a filha foi morta) para causar tal efeito.

Apesar deste pequena sinopse indicar um filme sombrio, os primeiros vinte a trinta minutos são quase exclusivamente dedicados ao humor. Personagens exageradas, situações forçadas... Mas nada disto é incomodativo. Enquando as camadas são reveladas percebemos que estamos perante uma grande obra que é muito mais do que aparenta. Criamos imediatamente uma ligação com Mildred, a mãe desesperada, até percebermos os problemas dos outros. Como diz uma das frases do filme: "O ódio nunca resolveu nada".

Uma vénia para Frances McDormand. Estes papéis caem-lhe que nem uma luva e neste caso é mesmo digna de Oscar. Sobre Woody Harrelson já pouco há a dizer e Sam Rockwell ganhou um fã.

Que bom que é ver um filme que quer ser isso mesmo: filme. Onde a criatividade é colocada em prática, conta-nos algo e entretém. Quero lá saber de como inventaram a mopa, esfregona ou lá o que era aquilo. Sim, David O. Russell, estou a falar contigo!

Resta-me agora seguir atentamente a carreira promissora de Martin McDonagh e pedir que para a próxima trabalhem num poster mais interessante.

8/10